quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Antropologia - O Contacto enquanto fricção interétnica


Antropologia: O Contato enquanto fricção interétnica

Depois 1960, após a observação da interação entre índios e não-índios, isto é, entre índios e a sociedade nacional, etnólogos brasileiros verificaram que as teorias que tentavam explicar o resultado dessa interação, como por exemplo, a teoria da aculturação, não eram mais suficientes.
           
Isto porque diferentemente de como preconizavam essas teorias, os índios brasileiros não perderam sua identidade étnica e nem  foram assimilados pela sociedade nacional. Nesse contexto, surge a teoria da fricção interétnica como uma crítica à teoria da aculturação e como teoria capaz de explicar tais resultados.
           
A teoria interétnica tem foco no estudo as relações sociais que acontecem dentro das sociedades que interagem, afastando a ênfase da orientação cultural para uma orientação sociológica, já que na interação, segundo a teoria, tais relações é que determinam os resultados observados, em relação à difusão, transmissão e assimilação do “patrimônio cultural”.
            
A concepção e abordagem de estudo da teoria interétnica é sistêmica, isto é, deve-se observar as sociedades que relacionam como um sistema, que se forma depois do contato, através de relações de oposição. Para Cardoso de Oliveira, após o contato, há uma existência co-participativa forçada entre duas sociedades dialeticamente opostas, que possuem interesses diametralmente opostos, o que acaba irradiando na mudança da economia, da ordem política e da organização social. Todavia, tais mudanças ocorrem porque cada grupo étnico acaba por reorganizar tais estruturas dentro de sua sociedade, de forma independente, com a finalidade de manter o curso do contato, de maneira ao menos razoável, dentro do sistema.
           
Desse modo, “as transformações sofridas pelas sociedades em contato interétnico não são os resultados da influência da cultura de uma sobre a outra, nem o produto de uma criação comum determinada pelos fatores postos em interação pelos grupos étnicos”.
           
Assim, a análise das relações sociais se torna mais importante para compreender o prognóstico das sociedades em contato do que o fator cultural. Portanto, para uma operacionalização da teoria é necessário que haja uma análise de três níveis determinantes das relações entre as sociedades: o nível econômico, o nível social e o nível político.
           
O nível econômico determina o grau de dependência do índio dos recursos econômicos potos ao seu alcance pelo não-índio e vice-e-versa. O nível social traduz-se na capacidade de manter um mínimo de organização, com a orientação dos membros para os fins, os quais são antagônicos. Já o nível político analise a natureza das relações de poder ou autoridade de um grupo sobre o outro, no sentido de dominação e reação.
      
É na interação que os níveis passam a se modificar, a se restruturar. O nível social tem uma preponderância na análise sistemática, porque ao representar  a orientação dos membros para fins antagônicos,  tem na persistência dessa orientação, frente aos interesses do outro grupo, uma forma de sobrevivência do grupo e que não o faz perder a identidade étnica.

LARAIA, Roque De Barros - Cultura um conceito Antropológico "Resumo"



Resumo da obra “Cultura: Um Conceito Antropológico” de Roque de Barros Laraia.

PRIMEIRA PARTE

No princípio da primeira parte, o autor mostra a preocupação de estudiosos em relação a outros povos e compara as várias visões desses pesquisadores de diferentes épocas, embora introduza a premissa de que são insuficientes as explicações do determinismo biológico e geográfico para elucidar o comportamento de tais povos, como afirmavam alguns desses estudiosos.

No primeiro capítulo, o autor deixa claro que compartilha do pensamento de que as diferenças genéticas/somáticas não determinam diferenças culturais, isto é, que o determinismo biológico não influencia o aprendizado e o engendramento de determinada cultura, processo denominado pelo autor como endoculturação.

A mesma linha de refutação é encontrada no segundo capítulo em relação ao determinismo geográfico, que hipoteticamente influenciaria a cultura dos povos, por se encontrarem em espaços físicos diferentes. O autor defende que a cultura age seletivamente e não casualmente e que através de centenas de estudos sobre vários povos, foi possível constatar que mesmo nos mesmos ambientes, haviam culturas diferentes e que existiam culturas bastante semelhantes em espaços físicos diferentes.
Já no terceiro capítulo da obra, o autor começa a discorrer da historicidade do conceito de cultura, dando continuidade após ter se referido a mesma no final do segundo capítulo como fator de diferenciação da espécie humana em relação às demais. O autor recorre, como ponto crucial, à definição de cultura proposta por Edward Tylor como sendo o “complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes e quaisquer outros hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade” , (LARAIA, 2001, Pág. 25), aludindo que tal conceito é uma síntese de vários pensamentos com a mesma linha ideológica, os quais se desenvolveram em vários estudos como os de John Locke, Turgot, Rousseau, autores que tentavam quebrar o raciocínio da relação entre natural e cultural, como domínios que se interagem diretamente. Em seguida, o autor trata das tentativas posteriores de clarificar o conceito
de cultura proposto por Tylor, bem como a definição dos limites desse conceito, o que chegou paradoxalmente a provocar uma confusão da conceituação e a sua desconstrução.

No quarto capítulo, o autor expõe a visão de Tylor sobre o campo da Antropologia Cultural equiparado às ciências naturais, isto é, segundo ele, de acordo com o estudo das culturas, pode-se verificar que esta também possui leis e características de ordem natural, organizadas e embasadas em alicerces elementares, como por exemplo, a "unidade psíquica da humanidade". Nesse contexto, Tylor defende que a Antropologia Cultural tem um objeto de estudo científico, assim como as demais ciências. A grande diversidade de culturas então seria explicada pelo grau desigual do processo de evolução, mas que mesmo assim apresentariam semelhantes características essenciais. Tais conclusões seriam descobertas através de uma análise comparativa histórica, levando-se em consideração os efeitos das condições psicológicas e meios ambientes, método mais tarde chamado de "particularismo histórico" por Boas.

Ainda no mesmo capítulo, o autor expõe as idéias de Kroeber e sua visão do ser humano como único ser capaz de criar seu próprio processo evolutivo, ao "superar o orgânico". Segundo Krober, ao invés de mudar o aparato biológico, a cultura é que seria adaptada aos diferentes ambientes ecológicos. Desse modo, o ser humano foi capaz de perpertuar a espécie ao longo dos anos e transformar todo o planeta Terra em seu habitat. Através da endoculturação, o homem aprende a romper as barreiras das diferenças ambientais e a dar vazão à criação. Assim, cada cultura tem o "gênio" que é capaz de produzir de acordo com suas possibilidades e necessidades. Nessa conjuntura, o autor então passa a refutar temas como os instintos humanos e supervaloriza o processo de comunicação como base para o desenvolvimento da cultura.

Já no quinto capítulo da obra, o autor começa a problematizar a origem da cultura como parte unicamente do ser humano. Nesse ponto, expõe algumas teorias, como a de Leackey e Lewin e o desenvolvimento da visão eteroscópia, bem como a capacidade de pegar os objetos com as mãos (fatores resultantes de uma vida arborícola); a de Pilebam e o bipedismo; Oakley e o desenvolvimento de um cérebro mais volumoso e complexo; Lévi-Strauss e a teoria da invenção da primeira norma; White e a elaboração dos símbolos; Ao final, o autor critica que tais teorias induzem a um aparecimento espontâneo do início da cultura, sendo partidário de que o aparecimento da cultura se deu contínua e lentamente, juntamente com o próprio
equipamento biológico.

As teorias modernas com a missão de restabelecer o conceito de cultura são explanadas no sexto capítulo da obra. O autor se vale do esquema proposto por Keesing, que divide as teorias em dois grandes grupos: as que tratam da cultura como sistema adaptativo (cultura como sistemas de padrões de comportamento socialmente transmitidos, analogia entre mudança cultural e seleção natural, tecnologia e economia de subsistência como bases e reguladores da cultura); e as teorias idealistas de cultura (cultura como sistema cognitivo, como sistemas estruturais, como sistemas simbólicos). O autor finaliza com a idéia de que delimitar o conceito de cultura é conhecer a própria natureza humana, revelando, pois, uma tarefa de perene reflexão humana.

SEGUNDA PARTE

O capítulo inicial da segunda parte traz diversos exemplos de como o ser humano, em decorrência da cultura, pode ter comportamentos diferentes, possuindo o mesmo aparato biológico. A princípio, alguns comportamentos fisiológicos básicos deveriam ser iguais por questões somáticas, como acontecem com os outros seres vivos, mas apresentam grandes diferenças em determinadas culturas, em decorrência do próprio processo de endoculturação, como por exemplo o riso, a sexualidade, o parto, o modo de comer, a própria comida e a visão do espaço,

O segundo capítulo abrange a influência da cultura em questões biológicas mais complexas, determinantes de saúde e de sobrevivência. Exemplos como perda de referências culturais (apatia), crenças, saudades e outros fatores podem interferir no plano biológico dos seres humanos e comprometer seu funcionamento somático equilibrado, levando-os muitas vezes à morte. Já em outros casos, as crenças e hábitos podem ser capazes de curar, restabelecendo o bom funcionamento biológico dos seres humanos. Talvez este seja o capítulo mais interessante da obra, pois revela como determinada cultura é capaz de transpassar barreiras somáticas através do processamento psicológico e solucionar problemas biológicos que em outras culturas pode não ser eficaz.

No capítulo seguinte, o autor demonstra que a participação de um indivíduo em sua cultura é limitada e diversa. Tanto as limitações como as participações do indivíduo em sua própria cultura podem ser determinadas por diferentes fatores como por exemplo
o sexo, a idade e costumes. Mais do que isso, esses fatores também podem diversificar e limitar papéis de maneira diferente em outras culturas, isto é, papéis desempenhados por determinados indivíduos de uma cultura podem ser desempenhados por outros em outra cultura. O autor ainda acrescenta que nenhum indivíduo é capaz e compreender o seu sistema cultural, mas que é necessário conhecer e englobar para si o essencial do mesmo para que se identifique e possa viver em harmonia consigo e com os demais.
            
O quarto capítulo dedica-se a explicar os princípios de juízos e raciocínios de cada cultura como sendo lógicos, por mais que pareçam ilógicos para as outras culturas. Acaba por tratar de que todas as culturas possuem a sua lógica Isto porque, nas palavras do autor, “Muito do que supomos ser uma ordem inerente da natureza não passa, na verdade, de uma ordenação que é fruto de um procedimento cultural, mas que nada tem a ver com uma ordem objetiva.” (LARAIA, 2001, Pág. 89). Assim, a compreensão do mundo em cada cultura é lógica.
       
A característica do dinamismo da cultura é tratada no capítulo quinto, tendo como causa principal a capacidade que tem o ser humano de questionar os seus próprios hábitos e modificá-los. Em outras palavras, a cultura é sempre alterada de forma mais rápida ou mais lenta, dependendo de cada cultura, isto porque o ser humano é capaz de rever SUS princípios e sempre busca uma forma de aperfeiçoá-los ou transformá-los. O autor ainda alude a dois tipos de mudança cultural: a interna ( resultante de uma catástrofe,  inovação tecnológica ou uma dramática situação de contato); e a resultante do contato de um sistema cultural com um outro.
Ao afirmar que todas as culturas estão sempre em constante mudança, o autor demonstra a importância de se entender tal processo, já que se poderá ser mais tolerável aos novos comportamentos e, além disso, com os comportamentos de outras culturas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A obra refuta veemente as correntes do determinismo biológico e geográfico como determinantes da cultura de um povo, e convence através de estudos empíricos e análises históricas (método defendido pelo autor) de que a cultura pode se desenvolver das mais variadas (e semelhantes) formas possíveis em qualquer lugar do mundo, sejam eles próximos ou longínquos .
           
A cultura é então vista como algo intrínseco ao ser humano, tendo vista que é um ser social. Não existe ser humano sem cultura,  e todos eles são capazes de aprender qualquer cultura, não importando sua raça ou origem. A cultura é tida como diretriz e formadora da visão de mundo de um indivíduo, que sem ela adoece, morre, como quando acometido de uma doença ou quando um órgão essencial para de funcionar adequadamente. E através dela que muitas vezes se curam e ‘e em nome dela que vivem, que se organizam e que buscam.
    
Não existe cultura superior à outra, nem mais desenvolvida, nem mais lógica. Todas elas possuem seus princípios válidos para seus respectivos indivíduos. Antes de tudo, todas as culturas têm o mesmo valor. 
           
As culturas são responsáveis pelo o homem ser capaz de transpassar os anos, sem a necessidade de modificarem-se somaticamente para resistirem às mudanças ecológicas. E por mais diversas que possam ser, todas obedecem regras elementares e genéricas, que podem ser estudadas com seriedade e cientificidade, para que se possa compreender a maior característica do ser humano, numa tentativa de se conviver pacifica e harmoniosamente.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Antropologia Biológica


Antropologia Biológica

Antropologia biológica (também chamada de antropologia física) é o estudo da biologia humana dentro da evolução, com ênfase na interação entre a biologia e a cultura.

As origens da antropologia biológica ocorrem no século XIX, quando começou a existir um maior interesse por parte dos cientistas em relação à origem do homem. Dúvidas quanto a origem divina dos humanos, aliadas à descoberta de fósseis como os dos Neandertais foram fatos importantes que levantaram questões quanto à origem e antiguidade da espécie humana. O interesse em tais questões aumentou ainda mais com a publicação do livro “A Origem das Espécies”, de Charles Darwin, em 1859. Ainda no século XIX, a variação física observada em diferentes povos instigou os cientistas a descrever e buscar explicações sobre a diversidade biológica humana.

Atualmente, a antropologia biológica é composta de diversas subdisciplinas, como a paleoantropologia, a antropometria, a primatologia, a genética e a osteologia. Dependendo da subdisciplina, os estudos podem ser realizados em restos esqueletais humanos antigos, em povos viventes atuais, ou em ambos.

A paleoantropologia é o estudo da evolução humana através de fósseis de hominídeos. Deste modo, é possível identificar as espécies de hominídeos que existiram, estabelecer uma sequência cronológica destas espécies e testar hipóteses sobre suas adaptações e comportamentos.

A antropometria, que teria surgido do interesse dos cientistas do século XIX na variação física das diferentes populações humanas, utiliza medidas de partes do corpo humano. A osteometria é um caso particular, na qual se medem partes do esqueleto e a craniometria é outro caso, na qual as medidas de restringem apenas ao crânio. Através da antropometria, é possível verificar adaptações de certas populações ao clima (através de proporções distintas entre partes do corpo), por exemplo. Já a craniometria pode ajudar a elucidar as relações dos diferentes povos entre si, através de semelhanças cranianas.

O estudo de primatas não-humanos, ou seja, a primatologia, é um campo importante na antropologia biológica especialmente devido aos estudos comportamentais (socialidade, comunicação, cuidado parental, comportamento reprodutivo, etc.), que podem dar pistas preciosas sobre o comportamento dos humanos modernos e dos hominídeos fósseis. Ainda, o estudo do registro fóssil dos primatas possui implicações importantes para a evolução dos hominídeos e, portanto, para a nossa evolução.

O estudo do esqueleto, chamado de osteologia, é realizado tanto em esqueletos humanos relativamente recentes, quanto em fósseis. Por exemplo, através da osteologia, é possível estimar a estatura e os padrões de crescimento de populações passadas. A paleopatologia é uma subdisciplina da osteologia que investiga a incidência de traumas, doenças infecciosas e deficiências nutricionais que deixam alguma evidência nos ossos de seus portadores.

Finalmente, o estudo da genética é importante dentro da antropologia biológica, não apenas porque nos permite explicar como funciona o processo evolutivo, mas também porque é possível investigar as distâncias evolutivas entre as espécies de primatas atuais (incluindo humanos), por exemplo. Os estudos de genética populacional também têm sido usados para esclarecer a origem dos humanos modernos, assim como as relações das populações humanas entre si.

Antropologia é ciência? Parte de seus membros diz que não



Decisão da Associação Antropológica Americana de retirar a palavra “ciência” de seu plano de atuação de longo prazo acentua divisões internas da disciplina

Antropólogos estão em meio a uma confusão sobre a natureza da profissão e de seu futuro depois que a Associação Antropológica Americana decidiu, em seu recente evento anual, tirar a palavra “ciência” da declaração de seu plano de atuação de longo prazo.

A decisão trouxe à tona tensões que há muito tempo existem entre pesquisadores de disciplinas antropológicas baseadas na ciência – inclusive arqueólogos e antropólogos físicos e culturais – e membros da profissão que estudam raça, etnia e gênero e se vêem como defensores de povos nativos ou direitos humanos. 

Nos últimos dez anos, ambas as facções passaram por uma amarga fase de combate tribal depois que o grupo mais ativo politicamente atacou trabalhos sobre os ianomâmis da Venezuela e do Brasil realizados por Napoleon Chagnon, um antropólogo de linha científica, e James Neel, geneticista falecido em 2000. Com as feridas desse conflito ainda abertas, muitos antropólogos da linha científica ficaram consternados ao saber, no mês passado, que o plano de longo prazo da associação não focaria mais no avanço da antropologia como ciência, mas sim no “entendimento público”.

Até o momento, o plano de atuação da associação era o de “avançar a antropologia como a ciência que estuda a humanidade em todos os aspectos”.  O conselho executivo revisou este tópico no mês passado ao afirmar que: “O propósito desta associação deve ser o de fazer avançar a compreensão pública de humanidade em todos os seus aspectos”. E a declaração foi seguida de uma relação de subdisciplinas que inclui a pesquisa política. A palavra “ciência” foi removida de dois outros trechos na revisão da declaração.

A presidente da associação, Virginia Dominguez, da Universidade do Illinois, disse em e-mail que a palavra tinha sido retirada porque o conselho pretende incluir tanto os antropólogos que não identificam seus trabalhos com a ciência, quanto aqueles que o fazem. Ela acrescentou que a nova declaração poderia ser mais uma vez modificada caso o conselho receba boas sugestões para fazê-lo.

O novo plano de atuação difere da “declaração de princípios” da associação, que segue inalterada e ainda descreve a antropologia como ciência.

Peter Peregrine, presidente da Sociedade de Ciências Antropológicas, filiada à Associação Antropológica Americana, afirmou em e-mail aos membros que as mudanças propostas iriam minar a antropologia americana, e pediu aos seus pares que expressassem suas opiniões.

Peregrine, da Universidade Lawrence, de Wisconsin, disse em entrevista que remover a palavra ciência só faz estourar de vez as tensões entre os dois grupos. “Mesmo que o conselho volte atrás usando a palavra novamente, o leite já foi derramado e está por toda parte”, disse ele.

Ele atribuiu o ocorrido a um ataque realizado por duas correntes dentro da antropologia. Uma é a dos chamados ‘antropólogos críticos’, que vêem a antropologia como um braço do colonialismo e, portanto, algo que deve ser liquidado. A outra é a crítica pós-moderna da autoridade da ciência. “Boa parte disso é como o criacionismo, que rejeita argumentos e pensamentos racionais”, disse Peregrine.

As chamas foram ainda mais atiçadas pelos blogs, como o Psychology Today, de Alice Dreger, uma historiadora da ética da medicina. Em declaração sobre o evento da Associação Antropológica Americana em Nova Orleans, ela escreveu: “Os antropólogos que não são ‘cabeça de vento’ estão se sentindo absolutamente incomodados nesse ambiente que denigre a ciência e promove substancialmente o ativismo à coleta de informações e teorização científica.”

A associação é “uma organização muito atormentada”, disse Dreger durante entrevista. “Quando vou lá é como assistir um casamento ruim que devia ter terminado há anos”, disse ela, em menção aos dois grupos.

Dominguez, a presidente da associação, negou que antropólogos críticos ou o pensamento pós-moderno tenham influenciado a nova declaração. Ela afirmou por e-mail que estava ciente que antropólogos de linha científica já expressaram desaprovação pelos colegas de outros grupos. “Mas eles fazem isso por motivos intelectuais”, ela escreveu no e-mail. “Também tenho consciência de que eles se sentem uma minoria crescente nessa profissão, ou pelo menos dentro da associação e seus próprios departamentos, e a marginalização nunca é uma experiência agradável”.

Antropologia Forense - O que é?


Antropologia Forense

É a área científica que estuda as ossadas. Resulta da aplicação de conhecimentos de Antropologia às questões de direito no que diz respeito à identificação de restos cadavéricos (necroidentificação).

Através dos ossos, podemos obter dados sobre o sexo, idade, estatura do falecido e pormenores da vida que a pessoa teve (hábitos alimentares, algumas doenças, lesões, etc.)

Os achados em escavações podem ter diversas origens: cadáveres abandonados numa fase avançada de decomposição, corpos desfigurados resultados de mutilações, ou, cadáveres que possam corresponder a indivíduos vítimas de desastres em massa (acidentes de aviação, naufrágios, catástrofes naturais, etc.). 

Todavia, este estudo só fica completo se se conseguirem recolher dados que em termos comparativos possam individualizar a pessoa pois só com os dados relativos ao sexo, idade, proporções corporais é praticamente impossível identificar o cadáver.

“Apesar de todos os humanos adultos terem os mesmos 206 ossos, não existem dois esqueletos iguais”.

Técnicas:O trabalho de um antropólogo começa no local do crime e estende-se até ao laboratório. Dividindo-se parcialmente em três etapas:

1º etapa - Arqueologia forense. É feita uma escavação minuciosa do local onde se encontra o corpo.

2º etapa - Antropologia social. Consiste na recolha de informações em redor da área do crime (entrevistas às pessoas da região, consulta em arquivos municipais, eclesiásticos e militares, etc.)

3º etapa - Investigação laboratorial. Há uma aplicação de técnicas como a osteologia humana (área que se debruça sobre o estudo dos ossos que compõe o esqueleto), paleopatologia (ramo da ciência que se dedica ao estudo das doenças do passado) e tafonomia (estudo sistemático da evolução de fósseis). Pode ainda ser feita uma reconstrução facial do cadáver e superposição fotográfica.

Em Portugal esta área não é muito usada pois não é frequente encontrarem-se ossadas, uma vez que no passado não ocorreram grandes catástrofes, nem se verificam muitos crimes onde os corpos são escondidos ao longo dos anos.

Objetivos da Antropologia Forense:

Determinação da identidade do indivíduo:
                                    
Origem dos restos. A determinação da espécie do cadáver constitui um passo fundamental. É o primeiro passo que um deve tomar quando se confronta com qualquer material que se assemelhe a tecido ósseo.

Características gerais de identificação

Ø A determinação do sexo baseia-se no estudo comparativo das ossadas encontradas com dados de tabelas sobre a morfologia dos ossos. As características morfológicas de certos ossos diferem consoante o do sexo. Os ossos que melhor permitem identificar se a ossada é feminina ou masculina são: o crânio, a pelve e o tórax. 

Ø Para se poder obter a idade da ossada, há um conjunto de regras que variam consoante se trata de um feto, de uma criança ou de um adulto. A partir da informação acerca da classe etária que a pessoa pertence, podemos saber a sua idade. As análises feitas são: ao comprimento dos ossos longos e a ossificação de alguns ossos (como as suturas cranianas).

Ø A altura é calculada através da medição do esqueleto (método anatómico), por fórmulas matemáticas ou pelo estudo dos ossos longos.

Ø A determinação da raça é um processo muito complicado e pouco fiável. Porém pode ser caracterizada através do ângulo facial, forma do crânio, Índices cefálicos e índices rádio- umerais. A partir desta análise podemos determinar se o indivíduo é do tipo racial caucásico, mongólico, negróide, indiano, australóide.

Características individualizantes. São os aspectos específicos que podem caracterizar o indivíduo com base em elementos fornecidos por pessoas conhecidas da vítima. Esta comparação pode ser feita com base em estudos radiográficos, comparação fotográfica (sobreposição de imagem em computador, pesquisando-se a existência de concordância entre as linhas e curvas da face com pontos do esqueleto) ou reconstrução da face (modelagem das partes moles sobre o crânio, ou através de desenhos).

Determinação da data da morte
                                     
É um processo extremamente complexo pois muitas vezes os corpos estão num estado muito avançado de decomposição, estando em muitos casos esqueletizados.

A decomposição de um corpo depende de fatores como a temperatura do solo e a sua acidez.

- Quando um corpo é deixado à superfície a actividade dos insetos vai ocorrer imediatamente.

- Duas semanas depois, o corpo estará parcialmente decomposto (com algumas cartilagens e articulações)

- Ao fim de oito meses, estará decomposto na sua totalidade.

Se um corpo for queimado leva entre um a dois anos até ficar totalmente decomposto
Se for deixado em solos arenosos podem mumificar ficando então conservado.

Quanto mais tempo sucede desde a morte, mais difícil se torna de determinar o momento da morte.

O número e o tipo de ossos disponíveis na cena do crime podem ajudar a determinar há quanto tempo se deu a morte do indivíduo, por exemplo: ossos pequenos dispersam-se mais facilmente.

Determinação do modo e determinação da causa da morte
                                       
O modo e a causa da morte são conceitos diferentes. O modo da morte aborda o tipo de morte do indivíduo podendo ser: homicídio, suicídio, acidental, natural e desconhecida. A causa da morte, refere-se ao fator que na prática provocou a morte do indivíduo, ou seja, descrições como doença, ferimentos ou lesões.

Em indivíduos que se encontram no estado de esqueleto, a causa da morte só pode ser estudada relativamente a situações que deixem marcas nestas estruturas como as fraturas, ferimentos por armas de fogo ou marcas de intoxicações crônicas pelo arsênio, sendo o raio-X uma técnica muito importante.

Interpretação das circunstâncias da morte

Esta interpretação é bastante difícil, complicada e as suas conclusões são escassas pois estão limitadas à análise da existência, ou não, de sinais de violência e da interpretação da vitalidade de certas lesões.


Fonte: CIÊNCIAS FORENSES

OLIVA, Anderson Ribeiro - A África não está em nós