quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Nuno Porto (1993). Reflexões Antropológicas: Um Percurso Bibliográfico

Objectivo do autor 
  • Revalorizar a reflexibilidade como ponto de partida para uma renovada consciência epistemológica atentando aos diversos níveis de complexidade que acompanham o trabalho do antropólogo.
Argumentos centrais do autor 

De acordo com o autor, a noção de reflexividade reconhece que os textos não se reportam, transparente e simplesmente, a uma ordem independente da realidade, segundo o autor os textos estão implicados no trabalho de construção da realidade, estas análises são também aplicadas nos textos de análise social.

Ainda na mesma linha de pensamento, o autor chama atenção a este tipo de abordagem bibliográfica nos textos e práticas antropológicas. O autor nos atentya a uma abordagem plural da realidade social aberta pela abordagem reflexiva debruça-se sobre alguns aspectos mais relevantes no domínio da ciência antropológica visando proporcionar uma bibliografia mais exaustiva sobre um determinado fenómeno social na qual estamos destacados.

O autor discute igualmente sobre o papel da escrita etnográfica como formadora do conhecimento antropológico. Enaltece a ideia segundo a qual qualquer ciência se pode definir a a partir daquilo que os seus praticantes fazem, segundo GEERTZ os antropólogos escrevem etnografias sendo estas, construções intelectuais de outras construções elaboradas pelas pessoas componentes da população que estuda.

A escrita etnográfica constitui um exercício de interpretação cultural, porque a cultura e algo directamente observável. 

O ponto de partida de uma abordagem reflexiva que e discutida pelo autor não se situa ao nível das representações textuais da cultura ou sociedades mas radica no problema epistemológico da indissociabilidade entre a teoria e a descrição etnográfica. Nesta problematização, o método do trabalho do campo e observação participante torna-se pertinente.

Os diferentes processos de inquérito, são construídos de acordo com uma posição interventiva do antropólogo nesses processos, o trabalho de campo perde o seu observador neutro para ganhar um agente conscientemente interactivo, dinamizador de um processo cultural. Portanto o trabalho de campo e uma reflexão entre a dialéctica e o imediato.

Por fim, o autor refere que a reflexividade como ponto de partida para uma análise antropológica consciente nos diversos níveis em que a prática se entretece, e das opções que cabem a cada autor fazer o seu próprio percurso como investigador.

Auge, e Colleyn (2004). Introdução em Antropologia 

Objectivo do autor
  • Mostrar como a antropologia pode ser o estudo do homem nas suas múltiplas dimensões, quer sociais, económicas, politicas e humanas e por ai adiante.
Argumentos centrais do autor

Em primeiro lugar o autor mostra nos que a antropologia refere-se ao estudo do homem no geral. O autor aborda a forma como as línguas e as organizações e económicas e sociais, politicas e religiosas se desenvolvem no decorrer dos tempos.

O autor defende uma concepção clássica e moderna da antropologia, clássicas porque as teorias do passado e os erros que elas comportam-nos ensinaram algumas coisas modernas porque az disciplina procura as suas próprias explicações sem se limitar a colher as apresentadas por uma autoridade tradicional. 

O conjunto dos métodos, das observações e das análises da antropologia pode contribuir para a explicação de um mundo contemporâneo que assiste a proliferação das diferenças e a abolição de barreiras.

O contributo da antropologia assenta sobretudo no método privilegiado da investigação de longa duração e no terreno, a observação participante, a comunicação directa com os agentes sociais que possuem a sua própria interpretação do mundo, para além disso de, beneficia também de uma fecunda base epistemológica adquirida ao longo de toda sua história que também a dos seus conceitos e hipóteses teóricas.

O estudo desta história com as suas extensões para as nossas preocupações contemporâneas resulta essencial porque toda as ciências humanas tem por base pressupostos antropológicos quase sempre implícitos que apenas um trabalho de análise pode actualizar.

Em última análise o autor procura abordar sobre os diferentes estajos do desenvolvimento da antropologia como ciência e a consequente mudança de abordagem para uma antropologia virada essencialmente na observação participante e no trabalho prolongado no terreno com os agentes sociais tendo em conta as suas respectivas experiencias e interpretações de vida e do mundo.

Adriano Alves (2009). Oque é Ciência Afinal?

A ciência é a especialização, um refinamento de potenciais comuns a todos, ou por outra é a hipertrofia de capacidades que todos têm. De acordo com o texto e a metodologia é a área da epistemologia que ocupa com o estudo crítico dos métodos científicos e enquanto a epistemologia seria a teoria de conhecimento.

Com bases nessas três definições pode-se já mostrar as suas interconexões uma vez que a ciência é um dos tipos do conhecimento existente e que aparece para explicar os fenómenos questiona-los, critica-los. A epistemologia vem estudar essa ciência questionando-o a sua origem e a justificação da mesma, isto é que a epistemologia estuda a natureza do conhecimento e a sua justificação. A metodologia nesse todo percurso examina os métodos científicos usados pela ciência, analisa criticamente a autoridade do cientista. A metodologia aqui preocupa-se com a obtenção quanto a justificação do conhecimento onde a análise do contexto de justificação mostra como o cientista posteriormente a descoberta, justifica os resultados obtidos. Contudo os três termos estão sempre interligados pois cada um deles preocupa-se em fazer ciência em teorias validas. A Antropologia é uma ciência que estuda o homem em geral, seu comportamento intelectual, os seus acontecimentos e procura as suas explicações.

Émile Durkheim e o “Facto Social”

Émile Durkheim inicia o livro “As Regras do Método Sociológico” definindo o que são “Fatos Sociais”. Ele ressalta que erroneamente se aplica a definição de fato social para designar todos os fenómenos que se dão no interior da sociedade. Na realidade há um grupo determinado de fenómenos que se distinguem dos demais fatos que ocorrem na sociedade.

Durkheim diz que quando um indivíduo desempenha um papel na sociedade, seja ele de marido, de filho, de pai, etc., ainda que suas atitudes estejam de acordo com os seus sentimentos, na verdade eles não deixam de ser atitudes objectivas oriundas de terceiros que são recebidas através da educação. Essas práticas interiorizadas acontecem em diversas áreas e ele cita como exemplo as práticas religiosas, as condutas profissionais, etc., que são práticas que funcionam independentemente do uso que os indivíduos venham a fazer delas.

As maneiras de agir, de pensar e de sentir que existem fora da consciência individual, ou seja, todas as formas de conduta que são exteriores aos indivíduos são exercidas por uma força coercitiva de imposição. Basta idealizar um caso em que uma pessoa tente se comunicar com seus compatriotas utilizando outro idioma que não é o praticado em seu país. Nessa hipótese a sua tentativa seria brutalmente frustrante. Ou ainda se outro indivíduo tentasse efectuar transacções económicas no seio da Europa utilizando o Yuan a moeda chinesa. Também aqui seus ideais seriam indeferidos. Durkheim usa exemplos como estes para demonstrar o poder coercitivo presente nas práticas cotidianas.

Segundo Durkheim é incontestável que a maior parte das nossas ideias e de nossas tendências não são elaboradas por nós, elas vem ao nosso encontro originadas por terceiros. Contudo, mesmo diante dessa coerção social, não se exclui totalmente a personalidade individual. Pode-se confirmar a definição de “Fato social” pela observação da maneira pela qual as crianças são educadas. Nesse exercício, salta aos olhos que toda a educação consiste num esforço contínuo para impor à criança maneiras de ver, de sentir e de agir, às quais ela não teria chegado espontaneamente. Se aos poucos essa coerção deixa de ser percebida é porque ela dá origem a hábitos internamente consolidados a ponto de serem classificados como normais.

Essa pressão que a criança sofre a todo instante, é a mesma pressão que o meio social exerce, tentando moldar os indivíduos. Mas não é a sua generalidade que pode servir para caracterizar os fenómenos sociológicos. Um pensamento que se encontra em todas as consciências particulares, um movimento em que todos os indivíduos repetem, nem sempre pode ser classificado como “Fatos Sociais”. O hábito colectivo não existe apenas em estado de permanência nos actos sucessivos que ele determina, mas se exprime de uma vez por todas, numa fórmula que se repete de boca em boca e se transmite pela educação. Claro que essa diferença nem sempre se apresenta de forma nítida, mas basta que ela exista para provar que o “Fato Social” é distinto de suas repercussões individuais. Destarte, é indispensável proceder essa diferenciação para analisar o “Fato Social em seu estado de pureza das outras formas sociais. A primeira vista a “Fatos Sociais parecem inseparáveis das formas que assumem os casos particulares, mas a estatística nos fornece o meio de isolá-los. No fim das contas, o que esses “Fatos” exprimem é um certo estado da alma colectiva.

Um “Fato Social” é algo completamente distinto, resultado da vida comum, das ações e reações que se estabelecem entre consciências individuais e se repercute em cada uma delas. Um “Fato Social” se reconhece pelo poder de coerção externa que exerce ou é capaz de exercer sobre os indivíduos. É toda maneira de fazer e agir que é geral na extensão da sociedade e ao mesmo tempo possui uma existência própria, independente de suas manifestações individuais.

A definição de ação social de Max Weber

De acordo com Max Weber ação social é um comportamento humano, ou seja, uma atitude interior ou exterior voltada para acção ou abstenção. Esse comportamento só é acção social quando o actor atribui a sua conduta um significado ou sentido próprio, e esse sentido se relaciona com o comportamento de outras pessoas. 

Só existe ação social, quando o indivíduo tenta estabelecer algum tipo de comunicação, a partir de suas ações com os demais. 

Weber estabeleceu quatro tipos de ação social. Estes são conceitos que explicam a realidade social, mas não são a realidade social. 

A análise da teoria weberiana como ciência tem como ponto de partida a distinção entre quatro tipos de ação: 

1. A ação racional com afins relação a um objectivo é determinada por expectativas no comportamento tanto de objectos do mundo exterior como de outros homens e utiliza essas expectativas como condições ou meios para alcance de fins próprios racionalmente avaliados e perseguidos. É uma ação concreta que tem um fim específico, por exemplo: o engenheiro que constrói uma ponte. 

2. A ação racional com valores relação a um valor é aquela definida pela crença consciente no valor - interpretável como ético, estético, religioso ou qualquer outra forma - absoluto de uma determinada conduta. O actor age racionalmente aceitando todos os riscos, não para obter um resultado exterior, mas para permanecer fiel a sua honra, qual seja, à sua crença consciente no valor, por exemplo, um capitão que afunda com o seu navio. 

3. A ação afetiva é aquela ditada pelo estado de consciência ou humor do sujeito, é definida por uma reacção emocional do actor em determinadas circunstâncias e não em relação a um objectivo ou a um sistema de valor, por exemplo, a mãe quando bate em seu filho por se comportar mal. 

4. A acção tradicional é aquela ditada pelos hábitos, costumes, crenças transformadas numa segunda natureza, para agir conforme a tradição o actor não precisa conceber um objecto, ou um valor nem ser impelido por uma emoção, obedece a reflexos adquiridos pela prática.

“Governamentalidade” de Michel Focault 1978 (2008)

A diferença entre soberania e arte de governar segundo Focault (2008) é: primeiro soberania é ter e governar um território, segundo governar é a arte de administrar o território, uma casa, almas, um convento, uma ordem religiosa, uma família, etc.

Governante pode ser chamado de monarca, Imperador, Rei, Príncipe, Magistrado, Prelado, Juiz e prelado que detêm de um poder contra a maioria. Enquanto Governar é a arte de administrar um território, uma casa, almas, um convento, uma ordem religiosa, uma família e crianças. Neste sentido governar um estado significa estabelecer a economia a nível geral do estado, isto é, estabelecer a relação entre os habitantes, as riquezas, aos comportamentos individuais e colectivos, uma forma de vigilância, de controlo tão atenta quanto a do pai de uma família. Desta feita governar e ser governado é precisamente a arte de exercer o poder segundo o modelo da economia.

Segundo Foucault (2008), dentre as várias formas de governo, que de uma ou de outra se cruzam no interior da sociedade e do estado, destaca-se três: a que diz respeito a moral, a arte de governar adequadamente uma família, o que diz respeito a economia, a ciência de bem governar o estado e o que diz respeito a política.

Para Faucault 1979 (2008), em relação a moral, a economia e a política, estes tem a suas singularidades, no entanto o importante é que apesar desta tipologia, as artes de governar postulam uma continuidade essencial entre elas. A doutrina do príncipe ou teoria jurídica do soberano procura incessantemente marcar uma descontinuidade entre o poder do príncipe e as outras formas de poder, as teorias de arte de governar procuram estabelecer uma continuidade ascendente e descendente.

A arte de governar segundo Foucault (2008), deve responder essencialmente, como introduzir a economia ou seja, a forma de gerir correctamente os indivíduos, os bens, as riquezas no interior da família. A nível de gestão de um estado, a introdução da economia no exercício político será o papel essencial do governo.

Na perspectiva de arte de governar segundo Foucault, Governo é uma correcta disposição das coisas que se assume o cargo para conduzi-las a um fim conveniente. Enquanto soberania tem o território como elemento fundamental para governar.

Segundo Foucault 1979 (2008), o governo na perspectiva de arte de governar é uma correcta disposição das coisas de que se assume o encargo para conduzi-las a um fim conveniente, com finalidade de um bem comum e a salvação de todos, se oponde deste modo a soberania. Destaca ainda outra finalidade do governo que é fazer com que se produza a maior riqueza possível, que se forneça as pessoas meios de subsistências suficientes, e mesmo na maior quantidade possível e que a população possa se multiplicar.

Na perspectiva de Focault (2008), o governo consegue atingir as suas finalidades, usando recursos jurídicos, criando leis que podem permitir a boa governação, transparência em exercício do poder. Portanto o governo pode atingir suas finalidades utilizando a lei como um instrumento que guia todo o processo de governação durante um determinado período.

Segundo Foucault (2008), a arte de governar deu proeminência, foi através de desenvolvimento da ciência do governo que a economia pode centralizar-se em um certo nível da realidade que nos caracterizamos hoje como económico, foi através de desenvolvimento desta ciência de governo que se pode isolar os problemas específicos da população. A arte de governar está em conexão com a emergência do problema da população, trata-se de um processo subtil que quando reconstituído com detalhes, mostra que a ciência do governo, a centralidade da economia em outra coisa que não a família e o problema da população que estão ligados.

Na perspectiva de Focault (2008) Em primeiro lugar, a população e a realidade dos fenómenos próprios, permite eliminar definidamente o modelo da família e centralizar na missão de economia em outra coisa, de facto se a estatística até então funciona no interior do quadro administrativo da soberania, ela vai revelar pouco que a população tem uma regularidade própria: o número de mortos, de doentes, regularidades de acidentes e muito mais, a estatística revela também que a população tem características próprias e que seus fenómenos são irredutíveis aos da família, as grandes epidemias, a mortalidade endémica, a espiral do trabalho e da riqueza, e outros, revela finalmente que através de seus deslocamentos, de sua actividade, a população revela uma especificidade pequena ao quadro familiar. Assim a família como modelo do governo vai desaparecer. Em compreensão. O que se constitui neste momento é a família como elemento no interior da população e como instrumento fundamental.

Nessa linha de pensamento Focault (2008) em segundo lugar a população aparecera como objecto final do governo, pois o objectivo do governo é melhorar a sorte da população, aumentar sua riqueza, sua duração de vida, sua saúde etc, e para tal o governo utilizará campanhas através das quais se interagem directamente sobre a população, técnicas que vão agir indirectamente sobre elas, e que permitirão aumentar sem que as pessoas se dê conta, a taxa de natalidade dirigida para uma determinada região ou para uma determinada actividade, o fluxo de população. A população aparece como um fim e um instrumento de governo que como força de soberano a população aparece como sujeito de necessidade, de aspirações, mas também como objecto nas mãos do governo, consciente frente ao governo, daquilo que ela quer e inconscientemente em relação aquilo que ela faça, o interesse individual como consciência de cada indivíduo constitui a população.

Suportando ainda das ideias de Foucault 1979 (2008), a economia política nasce a partir do momento que entre diversos elementos da riqueza, apareceu um novo objecto, a população. Que aprendendo a rede de relações contínua e múltiplas entre a população, o território a riqueza e outros, se constituirá uma ciência que se denomina economia politica. Em suma a passagem de uma arte do governo para uma ciência política, de um regime dominado pela estrutura da soberania para um regime denominado pelas técnicas do governo ocorre no século XVIII em torno da população e por conseguinte, em torno de nascimento da economia política.

A disciplina tem o seu lugar no triângulo: soberania- disciplina-gestão governamental, que tem a população seu alvo principal e no dispositivos de segurança seus mecanismos essenciais. A sua importância surge no momento em que procurou-se gerir a população.

Na perspectiva de Foucault Governamentabilidade designa três coisas a saber: o conjunto constituído pelas instituições, procedimentos, análises e reflexões, cálculo e técnicas que permitem exercer esta forma bastante especifica e complexa do poder que tem por alvo a população, por forma principal de saber a economia políticas e por instrumentos técnicos essenciais, os dispositivos de segurança.

A tendência que em todo o ocidente conduziu incessantemente, durante muito tempo a permanência deste tipo de poder, que se pode chamar de governo, sobre todos os outros, a soberania, a disciplina, que levou ao desenvolvimento de aparelhos específicos do governo e de um conjunto de saber. Por fim o resultado do processo através do qual o estado de justiça da idade media, que se tornou no século XV e XVI estados administrativos, foi pouco governamentalizado.

Viver na governamentalidade é viver na governamentalização do estado, que é um fenómeno particularmente astucioso, pois se efectivamente os problemas da governamentalidade, as técnicas do governo se tornam a questão política fundamental e o espaço real da luta política, a governamentalização do estado foi um fenómeno que permitiu o estado sobreviver. O estado é o que hoje graça a esta governamentalidade, ao mesmo tempo interior e exterior ao estado. Vivemos na era da governamentalidade, onde estão as técnicas do governo que permitem definir a cada instante o que deve ou não competir ao estado, o que é público ou provado do que é ou não estatal. Portanto o estado em sua sobrevivência e seus limites deve ser compreendido a partir de tácticas gerais de governamentalidade.

Referência Bibliográfica

Focault, Michel. 1978 (2008). “Governamentalidade” In Microfísica do poder. São Paulo: Edições Graal. Pp. 227-293.