quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Pessoa, Tempo e Conduta em Bali



Por: Élida Damasceno Braga [1] 
(elidabraga74@gmail.com)


Referência Bibliográfica

GEERTZ, Clifford. Pessoa, Tempo e Conduta em Bali. In: A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

Ao afirmar que o pensamento humano é uma atividade social essencial, Clifford Geertz apresenta suas preocupações em relação a isso já alertando, inicialmente, para a incompletude da temática. O autor se debruça sobre o povo de Bali para observar como as ideias se definem em torno do aparato cultural, como este povo percebe e reage e, por conseguinte, o que pensam, trazendo, assim, elementos para uma análise da cultura. Desse modo, as conexões que se mostram dão sentido para compreender não apenas a sociedade local, mas a humana como um todo.

Geertz (1978) traz os conceitos de cultura e estrutura social em seu texto, abordando-os de forma independente, ou seja, no sentido de que “é preciso compreender tanto a organização da atividade social, suas formas institucionais e os sistemas de ideias que as animam, como a natureza das relações existentes entre elas” (p. 227). O autor informa também a dificuldade de se trabalhar cientificamente o conceito de cultura, haja vista a indefinição do objeto de estudo.

No entanto, o pensamento visto como objetos em experiência com a impressão de significados através de símbolos significantes coloca a cultura no patamar de ciência como outra qualquer. O sentido para estes símbolos significantes é encontrado através dos acontecimentos vividos pelo homem com padrões, que se acumulam culturalmente. Vale salientar que, alguns desses padrões são inerentes à pessoa humana e por isso aparecem em diversas sociedades. Daí que vem a proposição do autor para que se lance um olhar mais atento para as singularidades a fim de que se compreenda a problemática subjacente.

Geertz (1978) destaca ainda a importância da caracterização humana individual. A perspectiva individual, por categorias, perfaz  “o mundo cotidiano no qual se movem os membros de qualquer comunidade, (...) habitado por homens personalizados, classes concretas de pessoas, positivamente caracterizadas e adequadamente  rotuladas” (p.229). Contudo, Geertz (1978) adverte para a não redução da análise cultural apenas à caracterização individual. Isso ocorre devido à falta de um método para analisar a estrutura significativa da experiência. Embora se tenham registradas algumas tentativas de análise cultural no sentido de uma fenomenologia da cultura, uma das que se destacam, segundo Geertz, é a de Alfred Schutz, com tópicos abordados sobre a “realidade principal da experiência humana: o mundo da vida cotidiana enfrentado pelo homem, no qual ele atua e vive”. Esses estudos deram suporte ao autor no sentido de orientá-lo em suas pesquisas.

Em Bali, Geertz (1978) observa uma série de padrões culturais, nos quais a atuação humana pode se dar em termos de ordem temporal, estilo comportamental e identidade pessoal, bastante diversas, mas nem sempre muito claras para os padrões empíricos. O autor descreve os tipos de rótulos aplicados aos indivíduos ali, um tipo de ordem simbólica a ser descrita em: nomes de pessoas, nomes na ordem de nascimento, termo de parentesco, tecnônimos, status e títulos públicos. Para se ter uma ideia, o nome pessoal não possui muita importância social em Bali, pois são raramente usados. Aos demais vão se acrescentando importância, afetando a condição humana com tal estrutura.

Outra questão que aparece no texto de Geertz é a maneira como as pessoas veem o tempo dentro do percurso biológico e também natural na sociedade balinesa. Além da condição pessoal, da definição de pessoa, desde “os nomes ocultos até os títulos ostentados” (p.255), o tempo em Bali é marcado, no geral, de modo qualitativo, no que se manifesta como experiência humana. "Ele é usado para distinguir e classificar partículas de tempo (...) os ciclos são intermináveis e sem um clímax, pois sua ordem não tem significação. (...) Eles não acumulam, não constroem (...) Eles não lhe dizem que o tempo é agora, eles apenas informam que espécie de tempo é" (p.260). 

Sobre a conduta, Geertz (1978) observou que a vida social em Bali é construída em torno do cerimonial, algo próximo à teatralização. Tudo nessa esfera é muito exterior, calculado, pomposo, uma sociabilidade polida e bastante estética. Nesse contexto, termos como a vergonha e o fracasso assumem características marcantes na vida afetiva do povo balinês, tanto no plano interpessoal como no plano coletivo. Contudo, a vergonha para os balineses, está no medo de não cumprir com os papéis sociais propostos, tratando-se de um verdadeiro terror a simples suposição de não atuarem em conformidade com o desempenho público desejado.

Desse modo, a análise cultural lida com formas cheias de significados. Significados estes que não estão diretamente nas coisas, nos objetos, mas lhe são impostos pelos homens que vivem em sociedade. A natureza da integração, da mudança e do conflito cultural deve ser procurada nas experiências dos indivíduos e dos grupos que sentem, percebem, agem e julgam estas simbolicamente, sem esquecer, no entanto, que essas sensações são apreendias e interpretadas. Logo, as estruturas simbólicas que definem pessoas, caracterizam o tempo e ordenam comportamentos. Essas são produto da interação, de como se desenvolvem, bem como o impacto que causam um ao outro (GEERTZ, 1978, p.272).

Portanto, o autor faz uma observação inquietante quando aponta a possibilidade de mudanças culturais na sociedade balinesa. Pensar em um tempo mais dinâmico, um estilo de interação social menos formal e uma condição de pessoa que saísse do quase anonimato, produziriam, assim, mudanças significativas no modo de vida, haja vista esses três possuírem papéis fundantes na estrutura social balinesa: a pessoa, o tempo e a conduta.

Por fim, as questões levantadas nesse texto, tantos modos de vida repletos de valores e significados, são vistos como elementos de controle social. Assim, a cultura ou elementos dessas culturas, contribuem significativamente, com as formas de controle e como definidores de comportamentos sociais. Trata-se, pois, de um estudo de percepção dos indivíduos dentro de suas culturas no sentido de analisar e descrever a estrutura de significados dessas.

[1] Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFS.

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